Jovens adoradores: cicatrizes do passado que curam o presente.

Fui abordado por um membro da igreja onde congrego, e a dúvida dele parecia um tanto sarcástica, ou até meio que sem “nexo“ espiritual (se for o caso), porém fiz de tudo para sanar sua questão a respeito do assunto que o afligia.

A dúvida era se “Deus aceita as manias dos novos adoradores“, que muitas vezes é seguida de um certo “ar mundano“, o que desperta nas massas um pouco de canibalismo espiritual (pasmem, essa foi a palavra que ele usou), denotando um pouco de carnalidade nas apresentações “góspiu“.

Bem, tentei ser o menos radical possível e responder com a mente de um jovem de 18 anos com uma guitarra na mão: me transportei para quando eu tinha meus 18 anos e tocava guitarra em uma igreja onde a música pouco importava se era bonita ou feia, arranjada ou destoada... o que realmente importava era “encher linguiça“ até chegar o momento da palavra, quando o pregador requeria toda a atenção somente para si.

Me lembrei dos momentos pavorosos em que as pessoas que me viam tocar ficavam espantadas pelo modo como eu gostava de tocar: pernas abertas, um jeans meio rasgado, tênis mal encardaçado, roupas pretas (sem dizeres ou nomes de banda, eu mesmo criava minha “grife“, ou seja, eu mesmo desenhava minhas estampas) e correntes de prata, ouro, espalhados pelos braços. Como eu me sentia seguro para encarar os mais de 1000 membros que lotavam a igreja às quintas e domingos, sem dizer das manhãs de Santa Ceia, quando havia até confraternização estadual, onde todas as filiais se reuniam para a Ceia mensal.

Muitos achavam o cúmulo do absurdo, outros me espraguejavam, outros faziam até o sinal da cruz, pois achavam que eu fazia aquilo para aparecer, para chamar a atenção ou ser o centro das atenções; porém, poucos sabiam de minha verdade: eu era um jovem com um sonho fixo na mente, queria ser guitarrista de uma banda de rock evangélico, e naquele tempo o rock não tinha lá muitos adeptos assumidos na igreja, pois muitos temiam retaliações, suspensões e até expulsão do rol de membros (a igreja era assim mesmo há alguns anos atrás).

Mas havia uma senhora que fazia de tudo para que o pastor não me castigasse, que não olhasse esse meu comportamento de maneira hostil, mas que me visse como alguém que gostava de ser um “rato de igreja“, pois quase todos os dias, ao chegar da escola, eu me reunia com os filhos dessa senhora (que era a zeladora da igreja e tinha a chave, claro...) e nós juntos disparávamos nossos “ensaios“, a todo vapor, a todo alto e bom som... recebi muitos castigos por isso, muitas foram as pregações em que eu era o assunto paralelo, citado como um rebelde, como alguém que queria denegrir ou profanar a casa de Deus, etc, etc.

Porém, o tempo passou, e eu permaneci firme em meu comportamento jovem, contudo o tempo nos faz amadurecer, e eu com minha vontade de conseguir chegar onde queria, consegui realmente tocar em muitas bandas, inclusive seculares, mas em nenhuma delas eu consegui me sentir realizado afinal. A moral da história é que enquanto era visto como um “adorador sem juízo“ ou um “músico rebelde da casa de Deus“, não me deixei levar por nenhuma das situações constrangedoras a que fui exposto por dezenas de vezes, permaneci firme e aprimorei e muito minhas técnicas musicais, consegui renome e respeito profissional, com minha experiência consegui conquistar muitos espaços onde pude mostrar um pouco de meu trabalho.

Trazendo essa reflexão para os dias de hoje, e respondendo a pergunta do amado irmão, penso que é preciso “uma senhora“ em cada um de nós para entender o que move o coração de jovens adoradores a serem tão “esquisitos“ na casa de Deus, e mesmo que todos repudiem, todos critiquem e façam pouco caso, o que realmente importa é que o jovem esteja dentro da igreja, sob os olhos atentos de Deus, fazendo o que faz de melhor, mesmo que com seu próprio estilo, mas que esteja lá, sob as asas de Deus.
Adorar a Deus hoje eu sei, é muito mais do que simplesmente tocar uma guitarra, tocar em uma banda, mas HOJE eu sei, amadureci dentro dessa perspectiva, consegui superar a tudo e a todos para compreender o que ninguém teve coragem de me explicar, mas traduziam suas insatisfações em gestos, palavras e atitudes egoístas e imberbes.

Penso que essa fase de minha vida me ensinou a enxergar Deus de verdade, pois até hoje ainda sou músico, porém com muito mais responsabilidade, muito mais experiência e habilidade, mantenho meu estilo, claro: pernas abertas, extravagante, inquieto, sob a vista de muitos um doido-varrido com uma guitarra na mão... mas para quem me viu e hoje me vê, um jovem que transpôs todos os obstáculos e mostrou a todos que o repudiavam que não era para eles que estava tocando, nem se apresentando, mas para a real razão de ser o que sou e sempre serei: Jesus Cristo, meu Senhor e dono de minha vida e tudo o que sou.

É preciso deixar o jovem adorador ser jovem e adorar, pois diante de Deus todos são iguais, e o que importa é o que o coração jamais irá dizer tudo o que sente de uma só vez, e poucos conseguirão entender. Então, vamos olhar tudo e pedir que ninguém os castigue, mas que os ensinem a amadurecer e a crescer no que fazem de melhor para Deus.

...os filhos da senhora com quem eu me reunia? Bem... todos são músicos em denominações diferentes, cada qual com sua própria família constituída... somente um seguiu carreira secular, mas continuamos a orar por ele... Quanto a mim... estou ainda por aqui, vendo outros jovens passarem pela fase que eu já passei, e hoje posso ensiná-los a passar por essa fase sem se ferirem, sem se machucarem, exibindo minhas cicatrizes.



Fonte: http://www.gospel10.com